sábado, 7 de julho de 2012

Post nº 58

FALANGE  GREGA  -  O  MELHOR  EXÉRCITO  DA  ANTIGUIDADE  ANTES  DA  LEGIÃO  ROMANA


Combate de falange contra falange. Vaso grego do século IV AC
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Até o surgimento de Epaminondas e de Felipe da Macedônia as vitórias militares eram fruto mais da astúcia dos generais e da valentia dos soldados do que da organização tática dos exércitos na batalha e das suas estratégias na guerra, mas Epaminondas queria engrandecer Tebas, sua pátria, e Felipe a sua Macedônia, não só pondo-a em pé de igualdade com os outros Estados gregos como submetendo-os ao seu poder e unificando-os em um poderoso grande Estado. Na execução do seu projeto, Felipe começou organizando um magnífico exército de dez mil hoplitas (soldados de infantaria), o que na Grécia era enorme, mas suas estratégia e tática eram as mesmas dos demais gregos, especialmente dos tebanos após as reformas que o eminente filósofo, estadista e general Epaminondas fizera no exército de Tebas, dando à sua cidade o domínio da Grécia.

Epaminondas foi um gênio militar cuja cultura, patriotismo, desambição
      e honestidade o fizeram o mais ilustre estadista grego da sua época

Epaminondas era muito respeitado por seus concidadãos, mas era modesto e jamais aceitara cargos no governo da cidade apesar da natural liderança que exercia, coisa que o fazia ainda mais popular e acatado por todos. Quando a guerra com Esparta estourou pediram-lhe que comandasse o exército de Tebas por ser sacrifício pela pátria ao qual não poderia se recusar. Ele aceitou e rapidamente montou poderosa força de combate na qual introduziu várias inovações que a tornavam superior à falange grega tradicional. A principal delas foi a substituição das lanças de dois metros dos soldados da vanguarda pelas de seis, chamadas “sarissas”. Assim, fez da falange um bloco mais compacto, com linha de menor extensão e fileiras de maior profundidade. Os lanceiros lhe deram o aspecto de “porco espinho”, com os quatro primeiros de cada fila apontando a lança para a frente na horizontal, a do segundo passando pelo primeiro, a do terceiro pelos dois e a do quarto pelos três à sua frente. O inimigo que ultrapassasse a primeira linha se depararia com a segunda, depois com a terceira e finalmente com a quarta, de forma que teria de passar por quatro linhas de lanças longas até ficar frente a frente com o soldado da primeira fila. Os lanceiros atrás dos quatro primeiros ficavam com as lanças na vertical e a baixavam quando algum dos quatro à frente tombava e o da quinta fila lhe tomava o lugar. Ultrapassar a barreira de lanças era dificílimo porque as linhas não ficavam paradas: avançavam em formação cerrada em cadenciado passo de marcha, atropelando e pondo o adversário em fuga.

Antes da hegemonia tebana as batalhas mais ferozes de falange contra falange foram na Guerra
                                   do Peloponeso entre Atenas e Esparta. Gravura de Hermann Vogel (séc. XIX)

A segunda inovação foi adicionar às linhas de lanceiros outras de espadachins. Depois que a massa de atacantes que não conseguira ultrapassar a muralha de lanças começava a recuar e os lanceiros apressavam o passo a marche-marche transformando-o em impetuoso contra-ataque, as linhas de espadachins na retaguarda corriam para os lados, ultrapassavam velozmente os lanceiros que marchavam a passo rápido e atacavam o inimigo pelos flancos, cercando-o e destruindo-o.

Epaminondas culminou suas reformas com uma inovação que mostra toda a sua genialidade militar: pôs a infantaria pesada na ala esquerda para ficar frente a frente com a infantaria pesada da falange adversária, sempre colocada na ala direita onde ficava o supremo comando segundo o modelo espartano. Ao invés de "A x B" ele adotou "A x A" e "B x B", onde iguais enfrentavam iguais, com a diferença que o seu "A" era muito mais poderoso que o "A" adversário. Quando a batalha começava, o "A" avançava enquanto o "B" mantinha a sua esquerda firme, mas o seu centro e a sua direita recuavam como se a falange fosse os ponteiros de um relógio marcando 12 hs e 35 min no começo da batalha e no período do meio 12 hs e 50 min, transformando sua linha reta em triângulo "ponta-de-flecha", o qual depois novamente se distendia e formava nova linha reta pelo avanço da ala esquerda e finalmente se dobrava em círculo sobre o inimigo, cercando e destruindo o que sobrara dele. Como o "A" da falange tebana era bem mais estreito e profundo que o "A" das outras falanges, a sua infantaria pesada na retaguarda logo se via frente a frente com a infantaria leve do inimigo e a destroçava ainda na primeira metade do período da batalha. A partir daí eram os seus "A" e "B" juntos contra o "A" adversário isolado e cercado.

Falangistas em combate eram um tema popular na pintura dos vasos gregos (séc. IV a.c.)

Essa complicada tática de Epaminondas foi chamada de falange em diagonal e deu a Tebas a vitória contra Esparta na histórica batalha de Leuctras, implantando a hegemonia tebana sobre toda a Grécia. Isto fez com que a falange grega passasse a se chamar falange tebana. Devemos frisar, entretanto, que a quase totalidade dos historiadores credita a invenção da "sarissa" a Felipe da Macedônia e não a Epaminondas, com o que não concordamos pelas razões que aludiremos adiante.

A hegemonia de Tebas deveu-se ao talento político e militar de Epaminondas. Sua morte em combate a deixou
                      sem liderança e ela foi dominada pelos macedônios. Detalhe de tela de Isaac Walraven (1726)

Porém a hegemonia de Tebas e da falange tebana duraria tanto quanto a vida de Epaminondas, pois era preciso grande capacidade de comando e habilidade tática para operá-la. Poucos anos depois da sua morte causada por ferimentos sofridos em sua última grande vitória, Tebas eclipsou-se por falta de lideranças capazes como a dele e a Macedônia tornou-se o novo poder hegemônico da Grécia através de uma versão mais prática e mortífera da falange, criada pelo rei Felipe e que foi chamada de falange macedônica.

Busto de Felipe da Macedônia
            
Além de gênio político, Felipe era gênio militar e reformou a Falange Tebana introduzindo-lhe várias novidades. Sua maior inovação foi extinguir a sua linha contínua, dividíndo-a em blocos retangulares compactos com um largo espaço entre cada um deles, de modo que quando o inimigo se lançava em turbilhão pelos espaços vazios, para evitar bater de frente com o “porco-espinho”, se bifurcava por espaços vazios que vinham depois e os lanceiros laterais de cada bloco mudavam a direção das suas lanças, triturando-o como se ele estivesse entre duas mandíbulas. Os que escapavam eram mortos pelos espadachins.

A grande maioria dos historiadores acha que as "sarissas" foram invenção dos macedônios e não dos tebanos, mas é difícil Tebas ter obtido tantas vitórias caso não as tivesse, pois sendo o seu exército bem menor que o de Esparta não poderia a sua delgada ala direita suportar o avanço da pesada infantaria da ala esquerda espartana sem se dissolver. O fato de ser possível a ela recuar ordenadamente em diagonal até fazer a linha original de batalha girar 180 graus deve ser creditado à invenção de uma arma notável como a sarissa, capaz de triplicar o poder defensivo da falange. Ademais, a passagem de Epaminondas e de Tebas pelo cenário político grego foi rápida e não deixou grandes marcas, sendo bem plausível que numa época em que não havia nenhum dos modernos meios midiáticos para registrar os fatos nem guardar com detalhes a sua memória, certos inventos tenham sido atribuídos a personalidades mais marcantes como Felipe. Poucos relatos históricos chegaram até nós e os que chegaram são de historiadores que escreveram décadas ou séculos depois dos acontecimentos, muita coisa tendo sido escrita apenas por ouvir dizer. Não é de surpreender, portanto, que a notável invenção do humilde Epaminondas tenha sido depois atribuída ao poderoso Felipe da Macedônia, pai do senhor do mundo Alexandre Magno.

O Império Macedônico no último ano do reinado de Felipe (336 AC)

Mas não há dúvida de que até o surgimento de Epaminondas e de Felipe a valentia do soldado era o principal e a formação de batalha o acessório nos combates, mas com as reformas de Epaminondas essa relação começou a se inverter e com as de Felipe ela se inverteu de vez. Em pouquíssimo tempo a antiga e tradicional falange grega virou Falange Tebana e esta virou Falange Macedônica, sendo com ela que Felipe pretendia conquistar a Pérsia após concluída a sua obra de unificação da Grécia e de controle de toda a costa ocidental do mar Egeu. Ao concluí-la e ter a sua retaguarda segura, Felipe declarou guerra à Pérsia e preparava-se para a invasão do grande império asiático quando foi assassinado em sua capital, durante uma cerimônia religiosa propiciatória, por um cortesão traidor, possivelmente a soldo do imperador persa. Assim, quis o destino que a enorme tarefa ficasse para o seu filho e herdeiro Alexandre, que a executaria com inexcedível genialidade política e militar.